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Por Lana Castelões.

 

As famílias já vinham se transformando socialmente e culturalmente com o imediatismo das relações interpessoais, com a redução do número de filhos, com a profissionalização da mulher e, de repente, tudo é paralisado com a chegada de uma pandemia que pode ser devastadora, segundo os profissionais da saúde.

Nos foi imposta uma obrigação geral de mudança drástica em nossas práticas, rotina e economia doméstica. Esta mudança repentina gerou efeitos nas relações familiares e em processos judiciais.

O maior problema parece ser o stress que todos estão sendo submetidos, causado, ou por medo do contágio, ou pelo medo do dinheiro acabar devido à paralização.

Todas estas circunstancias influenciam diretamente no ânimo das pessoas que ficam mais sensíveis e acabam se irritando com maior facilidade.

Algumas famílias possuem entre seus integrantes a presença de pessoas agressivas e violentas. Nestas circunstâncias, os mais vulneráveis (frágeis fisicamente), como mulheres, crianças e idosos podem ser vítimas constantes de violência doméstica e isto é muito grave.

É importante que a população saiba que, apesar da paralização do comércio, as delegacias e o poder judiciário estão trabalhando em modalidade de plantão durante o período de calamidade pública.

As vítimas e ou qualquer pessoa que saiba da prática de violência doméstica, como os vizinhos, devem ligar para a polícia e pedir socorro. Em algumas cidades temos as delegacias especializadas de atendimento à mulher, à criança e ao idoso. Há também o disc 100 que pode ser acessado para denúncia.

Em Goiás, baseando na Resolução do Conselho Nacional de Justiça nº 313, de 19/03/2020, o poder judiciário suspendeu os prazos de todos os processos judiciais por meio do Decreto nº 632/2020.

Apesar da suspensão, os juízes estão trabalhando na modalidade de plantão e os processos relativos à área de violência doméstica e da infância e da juventude são considerados essenciais, tendo garantida sua manutenção.

Com a diminuição da renda familiar de quem exerce atividade comercial ou autônoma, os pais e mães que pagam pensão alimentícia devem requerer à Justiça que a verba seja recalculada por meio de uma Ação revisional de Alimentos. Isto se perceberem que suas finanças não conseguirão abarcar a dívida alimentar.

É importante que o faça antes de se tornar devedor da pensão alimentícia, posto que poderá sofrer Ação de Execução pelo atraso no pagamento.

Uma alternativa é uma composição temporária para que haja redução em período determinado, no caso, enquanto durar o período de crise.

Quanto ao pai e mãe que já estão devendo alimentos e foram executados mediante prisão coercitiva, vale esclarecer que o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) através da Recomendação nº 62/2020, orientou no sentido de que a prisão civil por dívida alimentícia poderá ser cumprida em domicílio enquanto durar a possibilidade de contágio.

Esta recomendação já foi aceita pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça) que concedeu, em 19/03/20, liminar em habeas corpus para substituir o regime fechado de cumprimento da pena para domiciliar.

Esta decisão gerou inúmeros questionamentos de juristas no sentido de que o maior interesse da criança e do adolescente deve prevalecer sobre o de seus genitores.

Uma saída à criança ou adolescente que são credores de alimentos, seria requerer uma prisão processual por descumprimento da obrigação alimentar, para garantir a obrigação de fazer. A convenção do CNJ manifestou-se acerca da prisão civil, não alcançando a prisão processual.

O juiz também pode aplicar ao devedor de alimentos os chamados astreintes, uma pena pecuniária consubstanciada em multa diária fixada pelo órgão julgador como sanção para que o réu ou executado pague pelo dia de atraso de ordem judicial que o obriga a quitar a dívida alimentar.

Porém, os astreintes não vão para o credor, são apenas meios coercitivos para obrigar o pagamento dos alimentos.

Outra dúvida dos pais é em relação à guarda compartilhada e como devem proceder para proteger seus filhos de exposição ao contágio em época de quarentena.

Ambos os pais detém a guarda que lhes outorga poder de decisão sobre a criança. O bom senso dos genitores é a saída mais viável para entrarem em um acordo sobre como se dará o período epidemiológico.

A guarda compartilhada foi feita para que ambos os pais possam permanecer desenvolvendo o poder familiar sobre seus filhos, mesmo que separados.

Na quarentena, é importante que a criança permaneça em isolamento com sua família, dentro de casa, seja com o pai, seja com a mãe ou responsáveis legais. O que não pode ocorrer é a proibição de contato da criança com um dos pais sem que haja uma decisão judicial.

Mas, se um dos pais decidir em não ter contato físico com a criança, por entender ser medida de cuidado, é extremamente importante que a criança saiba o motivo do afastamento para evitar que ela não se sinta abandonada afetivamente. A saudade e o afastamento podem ser minorados através de ligações e mensagens via internet.

E os idosos?

Se os idosos não tiverem sido interditados por meio de decisão judicial, são considerados plenamente capazes para a lei. A Ação de interdição deve ser pleiteada quando o idoso está pondo em risco sua própria saúde física ou financeira e precisa da intervenção de um curador.

Na ausência de uma decisão judicial de interdição, os idosos são considerados independentes e possuem poder de decisão sobre todos os aspectos, o que limita a intervenção familiar quanto à mudança repentina em sua rotina.

Os familiares devem ter paciência e sabedoria para protegê-los e a negligência quanto a saúde do idoso pode responsabilizá-los futuramente.

Outras questões familiares que sofrem influência do período de calamidade pública são relacionadas aos direitos sucessórios. Um inventário por exemplo, só poderá ser aberto via administrativa quando os cartórios voltarem a funcionar. Neste caso, o prazo para abertura do inventário extrajudicial deverá ser suspenso até que os cartórios voltem a funcionar.

Quanto ao planejamento sucessório, o testador tem a alternativa de fazer o testamento particular, modalidade testamentária que não exige o instrumento público. No caso de enfermo que queira realizar o testamento com urgência, poderá fazê-lo onde quer que esteja internado, desde que tenha consciência no momento da realização do documento.

Em tempos difíceis, o direito de família deve alcançar aqueles para os quais foi criado e se adaptar às necessidades jurídicas que começam a aflorar neste período de crise.