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Por Rafael Lara Martins.

Sempre que um acidente acontece, seja ele de qualquer natureza, todos ficam impactados com o inesperado, com o choque. Por um momento, não se pensa com clareza, as decisões demoram para serem tomadas, as ações – por vezes retardadas, podem significar até a perda de vidas.

É claro que em um acidente como em Brumadinho, ações imediatas no local do acidente são quase impossíveis. Foi um desastre, uma tragédia, uma força avassaladora da água, lama e rejeitos destruindo tudo que estava pela frente e deixando um rastro de destruição. Mas logo após o acidente medidas importantes podem e foram tomadas. No caso de um desastre como esse, as autoridades públicas têm um papel até mais relevante do que a empresa. Mas isso não significa que a empresa nada possa fazer. Mas o que fez a Vale?

Em primeiro lugar, ela cuidou de organizar listas de pessoas desaparecidas, lista de pessoas com quem não havia contato, lista de pessoas resgatadas com vidas e até mesmo lista de pessoas que, infelizmente, tiveram apenas seus corpos resgatados. Além disso, a Vale providenciou, imediatamente, comunicação com a família. Independentemente de não ter “boas informações” e às vezes de nem ter informações. Isso é muito importante: transparência.

Por fim, foi anunciada uma medida que chamou atenção: a manutenção de pagamento de impostos à cidade e a doação de 100 mil reais para as famílias das vítimas fatais da tragédia. E aqui focaremos a essa doação para as famílias dos trabalhadores mortos. Segundo o porta-voz da empresa, essa doação é voluntária e independe de “qualquer outra providência” – o que a imprensa tem traduzido como “independe de indenização”.

É claro que a Vale tomou essas medidas, entre outras razões, pensando em sua imagem institucional e valor de mercado – face ao imediato impacto em suas ações na bolsa de valores. Mas o fator de agir imediatamente após o acidente também foi importante e certamente será considerado no futuro para se falar em indenizações.

A CLT prevê no artigo 223-G quais os critérios que a justiça deve utilizar para quantificar o valor de uma indenização (isso será tema específico de outra lição) e entre eles está o inciso nove do artigo, que diz que será levado em consideração “o esforço efetivo para minimizar a ofensa”. Mas a lição que se tira daqui e muitos empresários sempre questionam é: o que a empresa deve fazer imediatamente após um acidente de trabalho em sua empresa? Eventuais medidas compensatórias como essas, podem significar que a empresa está “assumindo a culpa” do acidente?

A primeira medida é ter certeza que a empresa cumpre as normas de saúde e segurança do trabalho, especialmente as que exigem programas de prevenção de acidente e pessoas responsáveis pelo seu acompanhamento e até mesmo combate. Todas as empresas devem possuir programas de prevenção de riscos ambientais e acidentes de trabalho – de forma geral, o PPRA ou o PCMAT, no caso das construtoras. Conforme o tamanho da empresa, outras obrigações de igual ou até maior importância para a prevenção e ação em caso de acidentes passam a ser obrigatórias, como a CIPA e até a existência de brigada de incêndio – que age também em primeiros socorros.

Conforme lembrado no início desse artigo, a maioria das pessoas ficam “paralisadas” quando se deparam com alguém acidentado. Em virtude disso é fundamental ter pessoas treinadas para agir nessas situações. Elas devem ser tão bem treinadas que agem automaticamente em caso de acidentes, tomando medidas emergenciais, como chamar socorro, por exemplo.

Passado o primeiro momento – tanto em acidente fatal como acidente não fatal, vem a questão: e agora? É imprescindível que a empresa entre em contato imediato com os familiares do trabalhador acidentado, prestando informações a respeito do acidente ocorrido, o hospital para o qual ele foi levado e até mesmo o Estado de gravidade. Informação e transparência, muito além de ações jurídicas, é obrigação moral e humanitária – inclusive para dizer que “não tem mais informações”. Fugir dos familiares só aumenta a tensão e problemas entre familiares e empresa em um momento tão delicado.

Outra dúvida frequente é: em caso de falecimento, a empresa deveria custear o velório e outras despesas? Se não houve falecimento, a empresa deveria custear despesas outras, como medicamentos? Essas ações representam um modo pelo qual a empresa “assume a culpa”?

A resposta é: não! O fato de uma empresa tomar medidas colaborativas, inclusive do ponto de vista econômico, não significa que ela esteja assumindo a culpa de um acidente de trabalho. A empresa, nesses casos, está agindo de forma adequada socialmente, independentemente de culpa. E, se no futuro eventualmente for constatado que ela foi culpada pelo acidente, certamente será levado em consideração “o esforço efetivo para minimizar a ofensa” para se arbitrar eventual condenação a pagar indenização.

Atuar de uma forma humanitária e responsável socialmente é sempre inteligente e a forma mais eficiente de agir. Mas recomenda-se, sempre, consultar um advogado quando ocorrer o acidente. Algumas medidas serão melhor tomadas com a preocupação de formalização de algumas ações: como, por exemplo, não entregar valores em dinheiro sem recibo para ajuda. Lado a lado com a responsabilidade social há a responsabilidade civil e devemos sempre nos preocupar com a comprovação futura!

Mas esse já é o tema da próxima lição: a responsabilidade civil em acidentes de trabalho. Sempre que houver um acidente de trabalho a empresa será obrigada a indenizar trabalhador e seus familiares?

Até a próxima.